Bate-papo

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Não há nada tão invisível quanto o monumento


Inauguração do Monumento a Ramos de Azevedo, em 1934, em frente à Pinacoteca do Estado de São Paulo.

Foi Andreas Huyssen quem citou a frase cunhada por Musil - que intitula este "post" - para expressar a relação entre monumento e esquecimento. Segundo o autor, "a permanência prometida pela pedra do monumento está sempre erguida sobre a areia movediça". O Monumento a Ramos de Azevedo, de 1934, é um bom exemplo de como o significado e o propósito originais de uma obra podem ser erodidos pela passagem do tempo.
O conjunto escultórico de 13 metros de comprimento por 15 metros de altura foi instalado em frente a um dos mais importantes edifícios projetados por Ramos de Azevedo, a Pinacoteca do Estado de São Paulo, em 1934, em homenagem póstuma. Contudo, no final da década de 1960, o monumento cedeu lugar a uma larga avenida para os automóveis e, sob críticas, foi transferido para a cidade universitária, onde encontra-se até hoje, próximo à Escola Politécnica.
A re-significação do patrimônio histórico e cultural e os seus desdobramentos na produção da memória social estabelecem uma forte relação com os conflitos de interesses presentes no espaço público. Em outras palavras, na atual concepção de espaço público, um monumento não pode ficar no meio do caminho dos carros. Assim, confinam-se pessoas em condomínios e monumentos em museus (ou em universidades, tanto faz) e celebra-se a cidade construída para a produção facilitada de riqueza.


Monumento a Ramos de Azevedo confinado no interior dos muros da Universidade de São Paulo.

É preciso viver o lugar

Vivenciar não é preciso; registrar é preciso. Essa é a idéia que parece dominar o cotidiano das pessoas no atual momento da informação. Assim, os nossos olhos parecem obsoletos frente às telas digitais das máquinas fotográficas e dos celulares disseminados por todas as classes sociais. O mesmo ocorre com a nossa memória, cada vez mais em desuso e substituída por cartões de memória digitais. Da restrita circulação dos ultrapassados álbuns de fotografia, passamos rapidamente para a proliferação de informações produzidas de forma cada vez mais dispersa, de modo que as nossas experiências podem ser compartilhadas com mais pessoas, sejam elas conhecidas ou completamente estranhas. Certamente, você já teve a vista atrapalhada por alguém tentando registrar algo que você insiste em ver apenas com os olhos. Não se trata aqui de condenar os recursos visuais, longe disso. Ao contrário, pretende-se conferir importância ao olhar, como forma também de refletir sobre o registro de uma determinada experiência, de brincar com as imagens junto com as nossas sensações. Se o lugar e a experiência são banalizados, banal será também a imagem. Na primeira vez que visito um lugar, evito levar a máquina fotográfica. No atual momento em que todos somos constantemente vigiados, o fato de não registrar algum acontecimento que, há pouco tempo atrás, bastaria a oralidade para contar, é um ato tido como lamentável. De amantes do mundo a cinegrafistas amadores, o lugar vai perdendo o sentido de ser.

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Mais um tempo de ausência e mais uma promessa de voltar por aqui semanalmente, assim como eu gostaria de ter feito.