Bate-papo

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O consumo desigual do espaço ou quando girar a catraca passa a ser um privilégio.


Antes de mais nada, peço desculpas aos leitores pelo vazio que este blog experimentou em julho. Estive envolvido com outros projetos e a falta de tempo foi implacável com as atualizações semanais do "Viaduto". A partir de agora, a periodicidade dos textos volta ao normal.

Nada melhor que retomar o blog com um chamado para que os lugares sejam acessíveis a todas as pessoas. A busca pela segurança fantasiosa tem motivado o uso de catracas e de outros esdrúxulos impeditivos ao livre acesso, criando barreiras cada vez mais difíceis de transpor, sobretudo para aqueles que são discriminados cotidianamente. Se não bastasse o irreal controle nos lugares privados, a prática de inibir o acesso vem sendo disseminada também nos espaços públicos, em especial nas universidades, lugares onde a convivência deveria ser facilitada para o bem da produção do conhecimento.

A catraca seleciona, ainda, aqueles que podem pagar pelo oneroso transporte público urbano, barrando os desempregados e os trabalhadores que não reúnem as condições materiais necessárias para consumir o espaço em iguais condições com os que podem se locomover com maior rapidez.

Por quantas catracas você passa todos os dias? A resposta pode estar diretamente relacionada com as suas possibilidades de participar do mundo, de consumir e de produzir os lugares.

Quantos lugares cabem dentro de um contêiner?

O mundo global possibilita uma circulação de mercadorias jamais vista na história da humanidade. Produtos de diversas nacionalidades estão expostos nas vitrines, muitas vezes trazendo em suas embalagens informações escritas em dois ou mais idiomas. Sem notar, usamos tênis fabricados na China, andamos em veículos produzidos na Argentina, carregamos bolsas costuradas em Taiwan. O processo mundial que proporciona o consumo de produtos multinacionais também cria uma perversa divisão internacional do trabalho. Explora-se a mão de obra barata, quando não escrava, dos países empobrecidos a troco de migalhas. Um sapato costurado a custo pífio por um indiano é exportado, recebe uma marca e, assim, tem o seu valor multiplicado exorbitantemente. Um exemplo disto está no blog "Sentir por Escrito", da amiga Juliana, num texto sobre o eventual processo de produção de uma grife mundial de sapatos femininos, a Catwalk. Outros casos também são muito bem evidenciados no excelente documentário canadense "A Corporação", onde as práticas das grandes empresas são analisadas (assista o trailer em inglês após o texto).
Os contêiners carregam consigo a vida daqueles lugares cujo papel no mundo globalizado está restrito a produzir bens de consumo a custos irrisórios, arcando com desastres sociais e ambientais diversos, em prol do consumismo desenfreado dos países ricos. Ao consumir um produto destes, nós estamos, também, participando da produção de um lugar onde, muitas vezes, sequer pisamos uma só vez.
TRAILER "THE CORPORATION" - "A Corporação"